quinta-feira, dezembro 20, 2007

DIÁRIO DE UMA NOVA VIDA

Oi, pessoal.

Finalmente o sonho se realiza. A Nina e eu, depois de 38 anos de casados, saímos de São Paulo e nos mudamos para o sítio, em Itatiba/SP.

Dentro de minhas veleidades literárias, resolvi que, de agora para a frente, escreverei um livro Diário desta nova vida.

DIÁRIO DE UMA NOVA VIDA

1º dia – Hoje, ao acordar, não ouvi as freadas dos ônibus junto ao ponto de parada, em frente de casa. Também não senti, durante o dia todo, as buzinadas malucas do trânsito congestionado. Nada daquele ar mau-cheiroso de São Paulo. Somente o ar puro de Itatiba. Logo cedo, fui acordado com um barulho bem diferente: a gritaria de um bando de macacos-prego passeando pelas árvores da beira do lago bem próximo. Fiquei ouvindo, com imensa felicidade, aquele som diferente. Música! Está certo que eu os ouvia quando passava os finais de semana no sítio, mas hoje foi diferente. Hoje, foi a certeza de que poderei ouvi-los todos os dias. Como pude viver tanto tempo longe disto?

2º dia – Hoje, fui acordado por um bando de saracuras. Vocês conhecem saracuras? São uma aves de perninhas compridas, andam em bandos e possuem um canto bem estridente, mas muito engraçado e alegre. Muito bom acordar desse jeito. Mais tarde, a caseira veio prevenir-me de que acabara o milho para os patos. Ué! E como os patos eram abastecidos antes? O caseiro do sítio vizinho fazia o favor de comprar e era reembolsado, com uma pequena gorjeta. Morando no sítio, devo assumir todas essas responsabilidades. E, afinal, qual é o trabalho de ir buscar milho para os patos? Peguei o carro e fui à cidade comprar milho. Descobri que o preço do milho caiu pela metade, desde a última vez que o vizinho o comprou. Sem falar na gorjeta. Mas, e o prazer de ver aquele bando de patos vindo ao meu encontro em busca do milho? Gentes, que coisa maravilhosa viver em um sítio.

3º dia – Hoje, não passaram nem os macacos-prego e nem as saracuras para me acordar. Fiquei na cama esperando por eles até depois das nove horas. Não dá para confiar nos animais para acordarem a gente. A Nina entra no quarto reclamando que a casa está sem água. Minha nossa! Ontem, com a história dos patos, esqueci-me de ligar a bomba que joga a água na caixa. É lógico que não é um simples incidente desses que vai me aborrecer. Dou um beijo na bochecha dela, que continua de cara amarrada, e vou ligar a bomba. São pequeninas coisas que não chegam a tirar o prazer da gente. Amanhã começarei a trabalhar no jardim da casa. Estou com excelentes idéias para a remodelação. Viva a vida no campo!

4º dia – Hoje, o barulho para acordar foi o barulho da chuva. Levantei-me e fui olhar. Algumas telhas quebradas, no alpendre, deixam passar água. Muita água! Anoto mentalmente: mandar revisar todo o telhado da casa e mandar trocar as telhas quebradas. Adeus início de trabalhos de remodelação do jardim. Com essa chuvarada, não dá. Vida no campo tem dessas coisas. Quando se quer chuva, ela não vem. Em compensação, quando não se quer... Lembro do provérbio inventado pela Vanessa, minha neta de oito anos (vide blog da Lu: http://eeepa.blogspot.com/ ): "Quando a gente não quer, tudo ganha." Sábia Vanessa!

5º dia – Hoje, acordei com o barulho de um bando de sagüis. É um tipo de macaco bem menor que os macacos-prego, mas também muito barulhentos. Dessa vez não foi engraçado. Ainda estou me lembrando dos gastos com o conserto do telhado e não há coisa alguma que me alegre. A caseira veio me dizer que as duas capivaras que apareceram no lago estão fazendo estragos na horta. Conseguiram rebentar o alambrado muito velho e enferrujado. Fui lá verificar o estrago e as possibilidades de conserto. Realmente, o estrago foi feio. O alambrado está imprestável e precisa ser totalmente trocado. Fiz um cálculo rápido do custo: pelo menos uns sessenta metros de alambrado, bem reforçado. Fora a mão-de-obra. Pessoal, é bom morar no campo, mas não é tão barato quanto estavam me dizendo.

6º dia – Hoje, tornei a ouvir o barulho dos macacos-prego. Lembrei-me, então, que há muito tempo não como bananas das bananeiras do sítio. E olhem que eu tenho sete variedades diferentes de bananas. Aquilo deixou-me perplexo pelo resto da manhã. Após o almoço, fui ver as diversas plantações de bananas. Diversos cachos em formação lá estavam. Mas, cachos de bananas prestes a amadurecer, no ponto de colher, nada! Mas encontrei muitos indícios de colheita de bananas: diversas bananeiras derrubadas para a retirada dos respectivos cachos de bananas. Fiquei uma fera e fui tirar satisfações com a caseira:

"Quem está colhendo as bananas, que eu não vejo nenhuma por aqui?"

"Eu também não vejo", respondeu-me ela. "É o pessoal aí das Nações (um bairro popular da cidade) que entra e leva tudo."

Fiquei uma fera. De tanta raiva, fui dormir sem jantar.



7º dia – Hoje, domingo, acordei tarde e com dor de cabeça. Fiquei louco de raiva com um bando de maritacas barulhentas que por ali passou, nessa hora. A família toda vem para o almoço. Fui até à cozinha e encontrei a Nina ocupada com uma grande quantidade de coisas.

"Cadê o cafezinho que o meu amorzinho fez para o maridinho queridinho dela?"

"Na garrafa térmica! Onde mais poderia estar? Abra a geladeira, pegue frios e prepare um sanduíche você mesmo. Estou muito ocupada fazendo o almoço. Esqueceu que hoje é folga da caseira?"

Com esse "alegre" bom dia, silenciosamente, preparei e comi meu sanduíche, acompanhado de um café morno e a explicação: "Já falei quinhentas vezes pra você que essa garrafa térmica está com defeito!"

Como não chove há alguns dias, fui molhar meus vasos de orquídeas. "Cadê a mangueira que estava aqui?" A caseira, que hoje está de folga e desaparecida, sumiu com ela.

O pessoal está demorando para chegar. Vou à geladeira pegar uma cervejinha.

"Não tem cerveja na geladeira."

"Como? Sabendo que vinha tanta gente e você não cuidou das bebidas? Será que eu sempre tenho que lembrar de tudo?"

Saí correndo para providenciar.

Quase três da tarde. O pessoal chega para o almoço. Eu estou "varado" de fome e doido por uma cerveja gelada.

Termino de almoçar e me preparo para ir tirar uma soneca.

"Pai, não vá se esconder que daqui a pouco vamos embora."

"Mas vocês acabaram de chegar!"

8º dia – Hoje, acordei com um sabiá cantando bem junto à janela do quarto. Levantei-me correndo e abri a janela.

"Sabiá f.d.p! Ta gozando da minha cara? O que é que tem aqui no campo para ficar alegre? Estou estressado com essa droga de mato. Quero voltar para São Paulo!"

Atirei meus chinelos nele. O bicho é muito vivo e conseguiu fugir.

9º dia – Hoje, eu estou pondo fogo nesta porcaria de Diário.

JF (direto de Itatiba/SP)


4 comentários:

Marco disse...

Bem... Pelo menos o seu bom humor e a verve com que voc~e conta suas histórias não foram para o espaço.
Pois é. Morar em sítio tem ônus e bônus. Espero que o primeiro não suplante o segundo. Carpe Diem. Aproveite o dia e a vida.

Luciana L V Farias disse...

pois é... fora as cobras passeando na cozinha e outros afins, kakakakaka...

beijocas!!!

Marco disse...

Vim desejar a você e família um Natal muito feliz, e que 2008 venha trazendo muita SAÚDE, PAZ e HARMONIA. Carpe Diem.

Lunna Guedes disse...

Confesso que imaginei o fim depois de ler as primeiras linhas. Passei férias em Itupeva e nos primeiros dias era tudo lindo. No sétimo dia dei graças pela viagem ter acabado e olha que o namorido estava junto. Mas é muito silêncio e muito bicho num mesmo lugar. Eu tropecei em cobra, pisei na coitada da aranha. Isso sem falar na quantidade diferente de sons de pássaros que cantavam a partir da cinco da manhã...
Não é pra mim. Mas espero que seja bom para vocês...