No dia 31 de outubro, em São Paulo, e acredito que também em outras cidades, a criançada dos prédios já sai vestida de bruxas e bruxos, batendo de porta em porta e gritando "Doce ou travessura", uma imitação dos festejos do “Halloween”, uma data que faz parte do folclore dos Estados Unidos.
Não sou contra o fato de os norte-americanos festejarem essa data. Muito pelo contrário! Faz parte de suas tradições e essas manifestações folclóricas devem ser mantidas.
Também não sou contra o fato em si de crianças brasileiras fazerem esse tipo de brincadeira. Eu já fui visitado por um grupo desses, em São Paulo. Liderados por uma pequena e linda bruxinha, a criançada brincava na porta de cada apartamento em meio a uma tremenda algazarra. E ver criançada alegre é uma das boas coisas que existem.
Agora, o que acho absurdo é o seguinte. Nesse dia, 31 de outubro, por declaração em lei, nós temos a comemoração do Dia do Saci Pererê, que é, possivelmente, o maior e mais conhecido mito do folclore brasileiro. Só que ninguém comenta, ninguém explica às crianças, nem na escola e nem em casa. Com isso, deixamos de lado nossas próprias tradições, para festejar as tradições dos outros. Ou será que alguém imagina que os norte-americanos é que irão festejar o Saci-Pererê?
Sabem, eu, particularmente, gosto muito de manifestações culturais de povos, seja de que paises forem. Mas, cada um na sua! Nada de invasões! Mas, o pior é que não estamos vendo invasões. Estamos vendo IMPORTAÇÕES.
Nos Estados Unidos, dentre diversos gêneros musicais, um que gosto bastante é o chamado "country music". É um gênero já centenário e que, hoje, já modernizado com instrumentos eletrônicos, é muito difundido, vende muito, e tem excelentes cantores (e muito ricos). É o equivalente, nos Estados Unidos, à nossa música caipira (que também faz muitos cantores ficarem ricos, o que é sinal de sucesso desse gênero - nada contra!).
Uma das coisas que a "country music" preserva é a forma de dançar. Em grupos, cadenciada, alegre, recatada, bem ao estilo do que se imagina uma música rural no final do século 19 e início do século 20. Muito diferente de muita dança ridícula atual, principalmente brasileira, que está mais para manifestação de sexo quase-explícito do que dança propriamente dita.
Muito bem. Os norte-americanos cultuam e mantém vivo esse gênero musical tradicional e a correspondente dança. E isso é ótimo! Eles devem manter suas tradições populares, mesmo!
No Brasil, também temos nossa música rural. Alguns criticam a sua "modernização", mas isto não vem ao caso, agora. O fato é que ela também existe e é muito difundida. E eu também gosto.
Aliado às nossas tradições rurais, culturais e religiosas, em todo o Brasil, de há muito tempo, no mês de junho, a propósito de se comemorarem as datas de Santo Antonio, São João e São Pedro, são celebradas as "festas juninas". Talvez, até, herança recebida da colonização portuguesa. Quem, aí, nunca participou de uma festa dessas, com fogueira, pau-de-sebo, quentão, paçoca, pé-de-moleque, fogos, balões, "casamento caipira" seguido da dança da "quadrilha"? E tudo isso com muita música "junina". Eram festas que se realizavam tanto no meio rural como nas cidades. Na minha infância, na cidade de São Paulo, lembro-me que a vizinhança fechava ruas para organizar essas festas.
Mas, os tempos foram mudando, os balões foram proibidos (felizmente, embora proporcionassem belos espetáculos), os compositores deixaram de fazer e de gravar as músicas próprias da época, as festas quase que desapareceram das grandes cidades (exceto no NE e no Norte, onde ainda existe muita comemoração junina). Tudo bem! Os tempos mudam e novas manifestações culturais populares vão surgindo.
Entretanto, manifestações da cultura popular não devem morrer. Precisam ser mantidas. Assim, nas grandes cidades, muitas escolas continuaram com a tradição das festas juninas, ao menos entre os alunos pequenos. E, ao menos entre estes, continuou a tradição de representar-se o "casamento caipira", de dançar-se a quadrilha, com as crianças devidamente fantasiadas. Não é exatamente como eram as antigas festas juninas, mas as crianças tomam conhecimento da existência dessa antiga manifestação de cultura popular brasileira. E isso é o que vale, pois mantém viva a tradição.
Pois bem! Minha neta veio me perguntar se eu iria vê-la dançar, na festa junina da escola.
-Você vai dançar quadrilha?
-Quadrilhaaaaaaa?????
Pasmem! Existem professores (ao menos eles próprios se classificam como professores!) que estão ignorando a nossa tradicional dança da quadrilha e substituindo-a pela dança do "country music", com música e tudo! Aí, eu pergunto: Será que os norte-americanos estão substituindo a sua dança de "country music" pela nossa "quadrilha? Será que eles estão cantando:
"Eu pedi numa oração
Ao querido São João,
Que me desse um matrimônio!
São João disse que não!
São João disse que não!
Isso é lá com Santo Antonio!"
Os norte-americanos estão certíssimos ao comemorarem o Dias das Bruxas, de cantarem e dançarem a “contry music”, e ignorarem o Dia do Saci-Pererê e a Quadrilha. Fazem parte de suas tradições folclóricas e eles não trocam por nada.
Os brasileiros estão erradíssimos ao comemorarem o Dia das Bruxas, ignorando o Dia do Saci-Pererê, de dançarem a “country music”, substituindo a nossa Quadrilha. Não fazem parte de nossas tradições folclóricas. Que tal cada um ficar “na sua”?
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Agora à tarde, aqui em Itatiba/SP, passando em frente a uma escola (PÚBLICA), um garoto de uns 10 anos, à porta, ostentava um enorme chapéu de bruxo. E os professores? Qual a orientação que dão aos seus alunos? Se o comércio precisa vender, por que não os gorros vermelhos do Saci Pererê? Está tudo errado.
A continuar assim, logo veremos os produtores de perus reivindicarem a criação de um feriado, no Brasil, para que todas as famílias possas comemorar o "Dia de Ação de Graças". Comendo peru assado, lógico!
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É isso, pessoal. Eu já havia feito a postagem quando fiquei sabendo da postagem coletiva "Importando Folclore", organizada pelo Ronaldo, lá do Vida Blog, http://omesmo.blogspot.com. Eu não podia ficar de fora! Editei a postagem. Para a semana, a história dos "irracionais que raciocinam" volta.
Um abração para todos,
JF
13 comentários:
Oi JF!
Soltou "as bruxas" - isso faz bem, seja no dia de hoje ou a qualquer tempo. Amém!
beijos e bom fim de semana,
Muito oportuno seu post, amanhã 31 de outubro, esta acontecendo uma blogagem coletiva com esse tema "Folclore importado" no blog http://omesmo.blogspot.com.
é só se inscrever!
JF
Certíssimo... é isso aí, penso da mesma forma.
O nosso folclore é vasto, e lindo, não precisamos importar dos outros.
Bjs
Meu caro JF, concordo com você em todos os sentidos e vou um pouco mais longe. Nas comemorações juninas a ignorância é tão grande que as garotas não se vestem de caipiras, com seus lindos vestidos de chita para irem a um casamento. Eles usam roupas como as da boneca Emilia, aquela do Monteiro Lobato... Outro ponto, as meninas passaram a usar chapéus de palha, outra aberração. Os vestidos também não são os das nossas caipiras e sim, das campesinas européias ... Nossa memória está se esvaindo, o que é uma pena. Falei sobre o saci no meu cantinho. Bjkª. Elza
Não sabia do dia do Saci!!
Concordo com ...
bom texto
beijoss
Também fiz parte da Blogagem Coletiva, adorei participar e ler tantas postagens ricas, divertidas, interessantes, me enriqueceu culturalmente. Saber a opnião das pessoas, discutir algum assunto,achei super interessante. Nos encontraremos em outra Blogagem Coletiva não é? Até mais então, bjs
http://aprendendonihongo.blogspot.com/2008/10/blogagem-coletiva-importando-o-folclore.html
Como é que é, amigo JF? Aí em São Paulo tem criança que bate nas casas, fantasiadas de bruxas e falando "doces ou travessuras". MEU DEUS! É O FIM DO MUNDO!!!!! Ainda bem que aqui no Rio não disso (AINDA!). Se baterem na minha porta eu dou-lhes um esbrega e os toco de lá com um quente e dois fervendo. Aí não se dança quadrilha nas festas juninas, se dança música country? Valei-me meu Padim Padre Ciço! Olha, sinceramente, eu esperava ficar velho e morrer sem saber de uma tristeza dessas...
Sobre a sua profecia do peru de Dia de Graças, eu já tinha imaginado uma coisa dessas há tempos atrás. Só que eu falei brincando. Não vai demorar e isso vai MESMO acontecer! É o apocalipse!
Carpe Diem. Aproveite o dia e a vida.
Os educadores no Brasil são mal preparados e mal informados. Esse dia do saci existe desde 2005 e muitos ainda não sabem. O que me deixa um tanto quanto 'doente' é ver pais deixando de lado festejos de família, o que dirá dos festejos comemorativos, tanto religiosos quanto da História do Brasil. Fiz um texto participativo desta blogagem e nele comento da 'sindrome de vira latas' em referencia a Nelson Rodriguês. Tudo bem que se comemore coisas de outros países, mas e as nossas raízes? Bom fim de semana!! Beijus
Olá JF sumido! Tudo bem? Gostou do vídeo do Lippi? Meu BB parou de tocar a gaita perto dele porque a cantoria uivosa deve ser por agredir seu ouvidinho...
Sobre os costumes, estamos mesmo numa colônia americana e se bobearmos mais um pouquinho eles tomam conta de vez. Aqui só existem bailes de fantasias no dia das bruxas. As crianças pedem doces de "ano bom" é na virada do ano e eu tenho pavor porque me acordam de madrugada com uma gritaria infinita! Não conhecia este costume (lá pro meu lado nunca teve). Sobre o saci, eu juro que vi um outro dia saindo do bambuzal e fazendo careta pra mim. Pena que ninguém acredita...
Um beijo procê e pra todos!
Viva o Saci. Aliás, ele é meu amigão...
Pra ver a diferença das coisas: na minha infância a gente dançava quadrilha vestida de caipirinha. Agora as crianças não dançam quadrilha, mas se vestem com roupa country, ou seja, botas, cinto e chapéu de cowboy... Sinal dos tempos...
A propósito, seu comentário me anima muito a continuar escrevendo minhas besteiragens...
Obrigada pelo apoio, volte sempre!
Oi, JF, obrigada pela visita e pelo comentário. Antes mesmo de publicá-lo, vim saber quem seria JF e já gostei de cara. Muito oportuno esse seu texto. Estamos vivendo de tal forma estrangeirizados, que, muitas vezes, nem percebemos mais isso.É triste ver que temos um folclore maravilhoso que quase não é aproveitado nem nas escolas, nem em textos de livros didáticos. As crianças, hj, crescem sabendo tudo que a internet informa, tudo que se faz lá fora, copia sem problemas, mas não conhece o que se passa tão perto, ou, muitas vezes nem tão perto, mas na sua terra.Isso nos entristece como cidadãos e como professores.
Bem, não vou esticar o assunto, que é muito vasto e eu ocuparia muito espaço... rs
Quero deixar meus parabéns e dizer que voltarei sempre.
Veronica
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